segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Kate, o clã e os lobos

Por mais estranho que pareça, um clã começa pelo amor. Um amor abarcador, imenso, delicioso. No fim é um facto, uma evidência.
Acaba sempre mal, na parte da estrutura, mas, o interessante é que as ramificações se medusam como um polvo... ou uma serpente, que sericota, depois de cortada a cabeça.
Em Portugal, Jane Birkin era a mulher amada de Gainsbourg, a lenda...fazendo esquecer que, antes dela, ele escreveu Je t'aime para BB (Brigite, a Bela).
Jane tinha uma filha, Kate, que levou para Serge G. criar com o sentimentalismo que lhe era conhecido. Aos 11 anos, quando Jane deixou Serge, já com Charlotte, Kate perdeu a referância do pai. Procurou o verdadeiro e deu-se bem até ele morrer....de ataque cardíaco. Passou pelas drogas, alcool, construiu uma associação para si e para os outros como ela. Reconstruida, fotografou como ninguém.
Mas a reconstrução é frágil quando somos humanos...






Kate Barry, 46 anos, era filha do compositor John Barry, que ganhou cinco Óscares, falecido em 2011, conhecido pela música de mais de uma dezena de filmes de James Bond. Apesar de ser conhecida como A discreta, esteve sempre LÁ quando era necessário.





Mas um clã é isto, desgasta-se de tanto suporte e apoio, tanto desacompanhamento fora de festas, desajustadas, tantos medos, tantas parvoíces a fazer de conta que se têm forças que nem o Menino Jesus tem no Natal - Lou Doillon, Charlotte Gainsbourg e o filho de Lulu....como se chama?lá vão continuar unidos e desajustados

As fotos de Kate vão ficar na história. A família e amigos vão remoer.
Tinha mudado de casa e o namorado ia lá jantar nesse dia...mas já a viu caida no pátio interior com o SAMU. os bombeiros, clinicamente morta,por queda do 4º andar.
O Clã Birkin está de luto. Eu também, Por Kate.


http://loudoillon.fr/

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

A floresta dos sonhos azuis


A balneoterapia das quartas tem sido uma lição de vida. Há apenas uma fisoterapeuta e uma assistente para duas crianças, dentro de água, além de mim. Eu faço os meus exercíos no meu canto, vou fazendo espaço e brincando quando se metem comigo. As mamãs assistem.
Os franceses chamam "frites" aos "chouriços" multicolores dos exercícios e "flores" "às borboletas" para os exercicios musculares com as mãos e braços.
Uma das pequeninas, três anos  não tem apenas trissomia 21, tem muitos problemas degenerativos musculares e mesmo ósseos.
A outra, dois anos, foi várias vezes operada a uma perna, para lhe retirarem um tumor maligno e 10 cm de osso. Depois enxertaram, acrescentaram pele e osso da bacia e do rabinho e hoje ela sorria como uma garota feliz e doce na água quente, a chapinhar, contente, com as suas braçadeiras e tanguinha com estrelas. A mamã dizia que, no futuro, a filha a pouparia de tatuagens sob o biquini...e riam muito. A sua menina salvou-se da morte e, depois da operação de setembro, recuperou os 10 centímetros que lhe faltavam e ostenta uma cicatriz direitinha da coxa ao tornozelo, ainda bastante vermelha.
"Cansa-se um bocadinho quando anda, e damos-lhe uma muleta....mas ela não gosta", conta a mãe..
Quando terminei os meus exercícios coloquei o "chouriço azul de espuma" na barra da piscina terapêutica, onde já estavam entalados chouriços de espuma amarelos, cor de rosa e verdes. Faziam um túnel para elas passarem por baixo, entrarem de um lado e saírem pelo outro.
Despedi-me, desejei um Bom Natal e muitas prendinhas do Menino do Céu. A pequenita, que comparava a perna dela com a minha, riu-se e chamou pela mãe - a bater com os pés e a empinar-se nas braçadeiras com bonecos: "Regarde, Maman! Maintenant, on a une fôret de rêves bleus!"

sábado, 7 de dezembro de 2013

Blasfémia pura

Será, oh Mãe de Deus 
que O criámos?
Blasfema e simples
pergunto:
onde está o meu último defunto
para onde foram
os amores da minha vida?
Porque estarão bem
se fiquei ferida?

Na guerra
levamos os camaradas
como podemos
às vezes em braços
arrastados, mutilados
outras vezes
apenas cansados
do desespero dos atropelos
da desumanidade.

Não morremos
nunca morremos
mas criámos um universo
que é um hospital de sobreviventes
um Paraíso
repartido e indecente
entre o Mundo do Mal
e a Mãe
que somos nós
de um Universo sem igual.


                                                       Maria João Carvalho

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Mandela porque sim


O humanismo de Mandela, como o do Dalai Lama, de João Paulo II, de Ghandi, de muito poucos desta fibra, tem de ser perpetuado com honra.
A dignidade deste homem que se sentou a beber chá com os carrascos, depois de liberto, que os convenceu a participar na grande festa da democracia multirracial, que se apaixonou perdidamente aos 78 anos - quando se sentia o homem mais sozinho do mundo e se casou, aos 80, com uma mulher como Graça Machel, tem de ser honrada. Os milhares de cidadãos que, neste momento o lembram, circunstancialmente ou de coração, têm de lembrar, amanhã, depois de amanhã, depois do dia 15 e no Natal, e Ano Novo, que Mandela não é um mito, é uma realidade, uma luz e uma energia que todos podemos partilhar. Tinha o rosto de um homem, inteligente, simples mas hábil, que já não está aqui mas que pode habitar a alma de quem lhe quiser abrir a porta. Os moçambicanos deviam abrir, porque estão mesmo ao lado, e Graça pode agraciá-los com alguma da sabedoria adquirida por mérito próprio e ao lado de Mandela....porque precisam. Os portugueses também.